CRÍTICA | ENTREVISTA COM O DEMÔNIO

Atualizado: 6 de jul.

O gênero do terror tem se destacado bastante, pelo menos nos últimos dois anos, com lançamentos que prometem “chocar” o público, ou se tornar o terror “mais perturbador” em anos. Em 2024 tivemos o angustiante “O Mal Que Nos Habita”, e ainda teremos outro que promete ser ainda mais perturbador, “Longless: Vinculo Mortal”, estrelado por Nicolas Cage e Maika Monroe. Mas temos o filme em questão, Entrevista Com o Demônio, produção que fez bastante sucesso mundo afora ainda em 2023, mas que só agora estreou nos cinemas brasileiros. Dirigido pelos irmãos Cameron e Colin Cairnes, “Late Night With The Devil”, no original, traz uma abordagem inovadora, consegue prender a nossa atenção desde o início com um suspense que vai crescendo cada vez mais, a experiência imersiva é sensacional, mas acaba se perdendo nos momentos finais. Na trama, o apresentador do talk show “Night Owls" Jack Delroy (David Dastmalchian), pretende fazer um especial de Halloween sobre possessão e eventos sobrenaturais, tendo como atração principal a garotinha Lilly (Ingrid Torelli), que se diz estar possuída por um demônio. Na tentativa de alavancar a audiência de seu programa, coisas estranhas começam a acontecer e tudo sai fora do controle.

Entrevista Com o Demônio funciona como um terror no estilo “found footage”, mas a diferença é que se trata de um episódio do programa noturno “Night Owls”, e essa é a grande sacada do filme. Antes de fato começar a edição, é apresentado um tipo de documentário sobre o programa e o seu apresentador, Jack Delroy, contando detalhes de como funciona a atração, e sobre a vida pessoal do apresentador. Quando começa o programa de TV, parece que realmente estamos assistindo a um episódio do talk show, como se nós fossemos os telespectadores, e isso é o que faz o filme dos irmãos Cairnes funcionar. E como toda atração, existem os intervalos – inclusive aparece até as vinhetas -, onde são mostrados os bastidores com cenas em preto e branco, e é aqui que entra a crítica social que a produção tenta fazer: o sensacionalismo barato, “fazer de tudo pela audiência” do programa sem pensar nas consequências (no caso aqui, trazer uma garota possuída ao vivo), e o papel da TV no entretenimento; temas esses que logo são descartados pelo roteiro.

A imersão que o público consegue ter ao assistir à produção é sensacional, e não somente pelo fato parecer que estamos assistindo o programa ao vivo. O que também ajuda nessa percepção é a direção de arte e o figurino. Parece que realmente estamos vivendo nos anos 70 e assistindo a um programa dessa época, desde o formato quadrado da tela, como era antigamente, até os figurinos, o cabelo, todo o estilo do programa de TV, as vinhetas, a música de abertura do talk show, as artes gráficas, e até as cores mais vintage, tudo muito bem produzido e perfeitamente colocado na trama.

A atuação competente de todo o elenco é outro destaque de Entrevista Com o Demônio. David Dastmalchian, que interpreta o apresentador Jack Delroy é o carisma em pessoa, pelo menos ao vivo no programa, tem presença de palco, e interage perfeitamente com o público, convencendo que realmente é um apresentador e que estamos assistindo um programa ao vivo. Já nos bastidores, Delroy só pensa na audiência do programa e na repercussão que a edição vai causar, ignorando os alertas de seus colegas, e até dos convidados. E junto com seu colega, e amigo, Gus (Rhys Auteri), “Night Owls” receberá quatro convidados especiais: o médium Christou (Fayssal Bazzi), o cético Carmichael, (Ian Bliss) e a médica parapsicóloga June (Laura Gordon), que cuida de Lilly (Ingrid Torelli), a garota que está possuída por um demônio, a grande atração da noite. Outra grande sacada no roteiro é trazer um cético entre os convidados, que tem a intenção de desmascarar os médiuns e provar que tudo não passa de uma farsa. Carmichael consegue ser tão chato e irritante, que faz o espectador torcer para que algo aconteça com ele, assim provando que a farsa é ele mesmo. Vale destacar também a jovem atriz Ingrid Torelli, que está assustadoramente diabólica, convencendo perfeitamente que está possuída.

Entrevista com o Demônio tinha tudo para ser perfeito, mas os dez minutos finais acabam com todas as expectativas. A escolha para o desfecho se perde totalmente, se tornando uma confusão que não consegue ser tão perturbador como foi prometido, além de tentar causar um impacto no espectador com uma cena especifica, falhando miseravelmente. Apesar desse final ruim, Late Night With The Devil é um dos filmes mais interessantes dos últimos anos, trazendo uma abordagem realmente inovadora – um caso de possessão em programa de TV ao vivo -, onde o público da sala do cinema são, de fato, os espectadores do talk show. O suspense vai crescendo à medida que os convidados vão aparecendo, a tensão toma conta de todos, e a trama prende a nossa atenção com as situações sobrenaturais que vão acontecendo, além de parecer que estamos realmente anos 70, graças ao excelente trabalho de direção de arte e figurino. Entrevista Com o Demônio não é um filme de sustos, foca mais no suspense e nos elementos visuais e sobrenaturais, e realmente é muito bom como um todo, apesar dos pesares.