Tem uma cena específica em "Clube dos Vândalos" – não é spoiler porque aparece no trailer -, que mostra Johnny (Tom Hardy) assistindo a um filme do eterno Marlon Brando chamado O Selvagem (1953). Kathy (Jodie Comer), que está relatando a história de um grupo de motoqueiros famosos dos anos 60 nos EUA para o jovem escritor Danny (Mike Faist), diz que foi ao assistir a esse filme que Johnny teve a ideia de fundar um “motoclube”, o famoso “clube dos vândalos”. Mas o curioso é que a cena escolhida do filme de Marlon Brando foi uma que o seu personagem (que também se chama Johnny) é questionado por uma jovem: “Johnny, contra o que vocês estão se rebelando?” Essa é essência de um grupo de motoqueiros, se rebelar contra algo – seja para fugir de seus problemas pessoais ou contra o “sistema” mesmo -.
Clube dos Vândalos (The Bikeriders) é inspirado no “fotolivro” do jornalista e fotógrafo Danny Lyon (no filme, interpretado por Mike Faist), que conta a trajetória de um grupo de motoqueiros dos EUA durante as décadas 60 e 70, o “The Chicago Outlaws Motorcycle Club”, onde o próprio Danny conviveu com o grupo, entrevistou e tirou fotos dos integrantes. Na trama, Katy (Jodie Comer), é quem conta os detalhes da vida do “clube dos vândalos”, que se apaixonou por um dos integrantes, o misterioso Benny (Austin Butler), que viu o grupo de desajustados do seu amado se transformar em uma gangue de criminosos. Norman Reedus, Toby Wallace, Michael Shannon e Damon Herriman também estão no elenco.
Com “The Bikeriders”, no original, o diretor Jeff Nichols consegue transportar o espectador para a década de 60 e prender a atenção sobre a história de um grupo de motoqueiros em uma época em que a realidade era cruel e violenta, no pós-guerra do Vietnã, onde eles queriam só se descontrair e escapar do mundo real. Quando esses motoqueiros vestiam suas jaquetas e andavam em suas motocicletas, eles se sentiam bem consigo mesmo, donos do mundo (ou pelo menos da realidade deles), e essa é outra essência de “ser um motoqueiro”. A reconstituição da época em que a trama acontece é perfeita, seja nas roupas dos personagens, a direção de arte, até a trilha sonora, e toda a realidade e os problemas dos anos 60 e 70. Já o roteiro de Clube dos Vândalos consegue fisgar o espectador ao mostrar como o grupo foi criado, a rotina, as relações entre eles mesmos e com as outras gangues, a rivalidade, e os problema que o grupo enfrentavam, liderados por Johnny, personagem de Tom Hardy. É um retrato intimista da vida desses motoqueiros rebeldes. Mas o filme perde um pouco o seu ritmo lá pelo final, e os momentos mais violentos e tensos não são tão surpreendentes como deveriam, parecendo que Jeff Nichols não quis ser mais ousado na abordagem. E deveria porque é um fato da realidade que o grupo enfrentava. Claro que isso não é um problema como um todo para a produção.
O elenco de “Clube dos Vândalos” está incrível, impressionando o espectador com suas performances convincentes. Tom Hardy interpreta Johnny, o criador do clube dos vândalos, e faz um personagem bem introspectivo, de poucas palavras, amedrontador, mas com um coração grande e que preza os valores originais do seu clube, carregando as responsabilidades em ser o chefe do seu grupo, sempre tentando manter a sua essência, já que muitas vezes ele é ameaçado por outros motoqueiros que querem pegar o seu lugar. Jodie Comer é um dos grandes destaques da produção ao representar com veracidade uma mulher americana dos anos 60 e 70. Com seu sotaque sulista, Kathy é a “narradora” do grupo dos vândalos, criando uma personagem cheia de camadas e contando todos os detalhes de sua convivência – os bons e os ruins - para o aspirante a escritor Danny (Mike Faist, de Rivais).
Mas acredito que Austin Butler, e o seu charmoso Benny, seja o grande destaque de “The Bikeriders”. Lembrando muito um Marlon Brando de Os Selvagens, Benny vê o grupo como um refúgio contra os seus problemas, onde Butler consegue pegar toda a essência de "ser um motoqueiro", dando vida a um personagem forte e misterioso com trejeitos marcantes. O problema aqui é que o roteiro não dá um desenvolvimento melhor para o personagem, onde o ator poderia ter mostrado ainda mais o excelente trabalho que faz como ator. E é impressionante como o personagem caiu perfeitamente para ele, desde as roupas, o corte de cabelo, e até os trejeitos são convincentes.
Para quem é fã da série Sons of Anarchy, ou que queira assistir a um agitado filme sobre motoqueiros e suas peripécias, irá se decepcionar. Clube dos Vândalos é um drama que explora as relações humanas, a perda da inocência, e que conta a história da formação de um grupo de motociclistas, sua rotina, os problemas e as confusões que acabam enfrentando, assim como os valores de amizade e lealdade entre os integrantes. Tem seus altos e baixos em relação ao ritmo do roteiro, e acho que poderia ter acabado de outra forma, mas é uma produção que consegue captar toda a essência de como é a vida de um motoqueiro, transportando o espectador para a década de 60 e diretamente para a rotina desse “clube dos vândalos”. Não chega a ser marcante, mas é um bom filme que poderia facilmente ter uma hora a mais. E apesar de ser baseado em uma obra que conta a história de um grupo real de motoqueiros, o roteiro teve várias alterações, assim como alguns personagens, onde a maioria se quer existiram.
CLUBE DOS VÂNDALOS (THE BIKERIDERS)
Ano: 2024
Direção: Jeff Nichols
Distribuidora: Universal Studios
Duração: 116 min
Elenco: Austin Butler, Tom Hardy, Jodie Comer, Norman Reedus, Toby Wallace, Michael Shannon e Damon Herriman.
NOTA: 9,5
Comments